Por Rebeca Siqueira
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7 de agosto de 2025
Corpos foram jogados na caçamba de um veículo. (Foto: Reprodução) Diário de PE O Gabinete da Central de Agilização Processual, do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), condenou o Estado de Pernambuco a indenizar em R$ 30 mil a mãe de jovem de 19 anos que foi morto e teve o cadáver exposto, em julho de 2019, durante uma operação da Polícia Militar (PM). Com oito mortos no total , a ação da PM chegou a ser classificada à época como "espetáculo macabro" e "culto ao sangue". Segundo a investigação, os baleados teriam participado de um assalto a uma caixa lotérica em Santa Cruz do Capibaribe, no Agreste de Pernambuco, que resultou em um policial morto. Os suspeitos foram localizados e mortos em um suposto confronto na Paraíba . Em seguida, os corpos foram expostos nas caçambas de viaturas enquanto os policiais eram aplaudidos pela população, conforme mostram vídeos. Na sentença, a juíza Maria do Rosário Arruda de Oliveira, do TJPE, discorda de argumento do Estado de Pernambuco, que afirmou não haver provas da exposição dos corpos de maneira desumana e humilhante. A magistrada também lembra que o caso teve ampla repercussão midiática e resultou em repúdio de órgãos de defesa dos direitos humanos. "É possível verificar, em diversas passagens, os corpos das vítimas sendo manuseados e transportados de forma aviltante”, escreve a juíza. “As mídias demonstram, com clareza solar, que os corpos foram despidos, encontrando-se nus ou parcialmente nus, e foram colocados na caçamba de uma viatura policial, empilhados e expostos publicamente". "A exposição pública de um cadáver em tais condições, despido e amontoado em uma viatura, representa um grave atentado à dignidade póstuma e causa profundo sofrimento, angústia e humilhação aos familiares, que se veem obrigados a reviver a dor da perda de forma brutal e desrespeitosa", ela acrescenta. Condenação No pedido de indenização, a advogada Márcia Araújo, que representa a mãe do jovem morto, diz que a operação resultou em um "verdadeiro show de horrores". "Foram jogados nas caçambas das viaturas, como se fossem troféus, expostos à curiosidade pública, em um verdadeiro desfile, com direito a sirene ligada", escreve. A advogada acrescenta que houve voluntária violação da cena do crime. "Como noticiado nos fatos, impossibilitou a realização de perícia no local; notadamente, a intenção foi apenas uma, não permitir que a perícia pudesse afirmar se houve ou não troca de tiros". Ela pediu R$ 150 mil de danos morais. A advogada Márcia Araújo afirmou que o valor de R$ 30 mil de indenização ficou muito abaixo do que esperavam. Ela também representa familiares de outras duas vítimas da mesma ocorrência, mas ainda não houve sentença nos demais processos. Nos autos, o Estado de Pernambuco declara que o jovem morto estaria envolvido em uma série de crimes e poderia representar perigo à vida dos agentes públicos. "Não há qualquer prova nos autos que corrobore com o abuso e excesso que os agentes policiais possam ter cometido", declara. "Pontua-se, ainda, que não há qualquer prova que demonstre que houve a exposição dos mortos como narra a parte autora nem muito menos a divulgação de imagens ou desfile de viaturas após o ocorrido. Na verdade, os agentes públicos agiram em prol do interesse público", completa. Em nota ao Diario, o Estado de Pernambuco afirma que foi intimado da sentença em 1º de agosto de 2025 e está analisando a interposição de recurso. A operação Um grupo criminoso assaltou uma casa lotérica em Santa Cruz do Capibaribe, no Agreste de Pernambuco, em 1º de julho de 2019. Na saída, houve confronto e um policial militar morreu após ser baleado na cabeça. Em ação conjunta com forças da Paraíba , o bando foi localizado posteriormente em um sítio, no limite entre Barra de São Miguel e Riacho de Santo Antônio, municípios paraibanos. No discurso oficial da PM, a equipe foi recebida a tiros, o que os forçou a "uma reposta à altura do efetivo". Nenhum policial ficou ferido na ocorrência. Após as oito pessoas serem mortas, seus corpos foram expostos em viaturas, sendo filmados e fotografados. Imagens mostravam moradores aplaudindo a polícia. Na época, o Conselho Estadual de Direitos Humanos da Paraíba (CEDH-PB) repudiou a ação conjunta das polícias Civil e Militar de Pernambuco e da Paraíba, classificando o ocorrido como "espetáculo macabro" e "culto ao sangue". "Tal cenário, nada distante do culto ao sangue do antigo Coliseu de Roma, concorre não para o fortalecimento, mas para o descrédito da atividade policial, transformada, pelo tratamento absurdo da cena do crime, em um grotesco ato de vingança selvagem, a anos-luz de distância da ideia de uma ação policial racional, eficiente e planejada", diz trecho da nota.